A República, proclamada no Brasil em 1889, trouxe ao país não apenas um novo sistema de governo, como também tentou disseminar o pensamento positivista (que a idealizou)e deu uma nova interpretação à história. O passar dos anos ofuscou personagens e fatos que marcariam as crônicas, proporcionando uma compreensão do processo de desenvolvimento social, político e cultural do país.
E entre esses “prejudicados” pelo novo regime está o patrono do município:
Conselheiro Lafayette Rodrigues Pereira; prejudicado porque, nas páginas dos compêndios de histórias, pouca ou nenhuma referência se faz àquele que foi considerado o pai do Direito Brasileiro, um dos homens cujas atitudes aparentemente controversas expressam, ao contrário, sua ortodoxia ideológica e austeridade jurídica que marcariam sua conduta, seja em família, na política, no Direito, e até mesmo em suas impressões literárias.
Esse homem, desconhecido, principalmente, por seus conterrâneos, que por causa de seu nome são lafaietenses, nasceu na Fazenda dos Macacos, às margens da Estrada Real e, pelos fundos, da BR-040, em 28/03/1834, filho do coronel Antônio Rodrigues Pereira e de Clara Ferreira de Azevedo. Os primeiros estudos Lafayette os fez, com seu irmão Washington, em casa de seu tio paterno, padre Felisberto Rodrigues Milagres, na cidade de Prados, de onde seguiu para São Paulo, onde diplomou-se em Direito na Faculdade do Largo de São Francisco.
Lá, também, ele começou a se despontar como flósofo, cujo exercício lógico o influenciaria nas conclusões de seus estudos jurídicos, posteriormente.
Após quatro anos em São Paulo, Lafayette retorna à Minas como promotor público na comarca de Ouro Preto, em 1857. Pouco depois, seguiu para a Corte, onde realizou seu tirocínio junto com o advogado Teixeira de Freitas. Nessa época começou a compilar o confuso Direito Brasileiro da época. A partir dessa experiência e de seus estudos realizados por toda a vida, Lafayette traçou os fundamentos do Direito Brasileiro para a elaboração do Código Civil. Como jurisconsulto, publicou: “Direito da Família” (1869); “Direito das Cousas”(1877); “Propostas e Relatórios Apresentados à Assembléia Legislativa” (18ª Legislatura); “Questão Comercial”; “Princípios de Direito Internacional” – 2 volumes (1902); “Código de Direito Internacional”; e diversos “Pareceres” jurídicos em forma de opúsculos.
Como jornalista, Lafayette estreou na “Revista Mensal do Ensaio Filosófco Paulistano”, em 1854. Na Corte, com Flávio Farnese e Bernardo Guimarães, lançou “Actualidade” (1858), o primeiro jornal vendido avulso nas ruas. De 1861 a 1865, com a colaboração de Flávio Farnese e Pedro Luiz, editou a folha “Le Brésil”, de circulação na Europa. Outros periódicos tiveram a sua colaboração, ora com observações literárias, ora com análises políticas, inaugurando um novo estilo jornalístico, principalmente após o lançamento de “A República” (1870), com uma grande responsabilidade na conscientização de uma abertura política e social no Brasil. Dirigiu, ainda, “Opinião Liberal” e contribuiu com o “Jornal do Commercio”, em 1898, publicando,sob o pseudônimo de Labieno, a célebre defesa da obra de Machado de Assis dos ataques literários de Sylvio Romero.
Como se não bastassem suas qualificações como político de alto reconhecimento e jurista de raro brilho, em 1909 Lafayette foi, nada mais, nada menos, o sucessor imediato de Machado de Assis na Cadeira 23 da Academia Brasileira de Letras., ocupada por Jorge Amado e pela escritora Zélia Gattai.
O político
Foi na política que Lafayette se notabilizou, visto a jurisprudência acabar restrita a uma área. Em 1864, com apenas 30 anos, foi nomeado presidente da Província do Ceará e, no ano seguinte, à Província do Maranhão. Considerado um neófito na política, essa nomeação suscitou dúvidas e críticas à sua capacidade administrativa, porém seus atos desmentiram as calúnias que lhe impetravam.
No Ceará e no Maranhão, encontrou dificuldades diversas, como a oposição política, o interior das províncias desprovidos de recursos, esquecidos à sorte das epidemias e da ignorância. E foi nas áreas de educação e saúde que conseguiu reverter aquela triste realidade.
Sua militância no Partido Liberal e sua subscrição no Manifesto Republicano, em 1870, não prejudicou
seu relacionamento com Dom Pedro II, que o nomeou Ministério da Justiça em 1878, permanecendo na pasta até 1880. Seu trabalho, nesse período, revela a intuição do jurisconsulto e os golpes de atilamento do estadista. Em 1879, o imperador o conduziu ao Senado, passando a ser fgura notável nas discussões parlamentares, merecendo, 3 anos depois, o cargo vitalício de membro do Conselho de Estado.
O ano de 1883 marca a vida política de Lafayette, chefiando, a partir de 24 de maio, o 31º gabinete do segundo reinado. Durante seu mandato, destacam-se o decreto ordenando a conversão dos bens das ordens religiosas em apólices da dívida pública, o assassinato de Apulcro de Castro, a questão servil que quotidianamente se avolumava, exigindo solução. Também a exoneração do ministro da Guerra, Rodrigues Júnior, demitido por meio de uma carta do Presidente do Conselho, em que o acusava de tíbio e hesitante na gestão da pasta. Findou o gabinete em 6/6/1884.
Na política externa, foi figura importante na Questão do Chile na comissão arbitral, em 1885, com sumo agrado pelas partes litigantes, graças ao seu alto saber jurídico e rara ponderação. Três anos depois, seguiu para os Estados Unidos, como Ministro
Plenipotenciário à 1ª Conferência Pan-americana. Um mês após, instaurava-se a República no Brasil.
O Marechal Deodoro o confirma na delegação, mas Lafayette declina da nomeação, indo refugiar-se na França, donde retornaria ao seu país apenas em 1892.
Antagonicamente à ideologia liberal de um republicano convicto, nutria verdadeira devoção pela família imperial, a ponto de não mais participar da política brasileira. Foi condecorado com a Ordem da Rosa, grau de oficial, em 1866, pelos relevantes
serviços prestados em relação à Guerra do Paraguai, quando presidente da Província do Ceará; e em 1888 com a Grã-Cruz da Ordem de Cristo.
Últimos anos
Lafayette viveu seus últimos anos estudando e no convívio da família, em sua chácara na Gávea.
Os relatos de família apresentam-no como afável e atencioso marido e extremoso pai. Casara-se com 36 anos de idade, enquanto sua noiva tinha apenas 19 anos, Francisca de Paula de Freitas Coutinho, flha de um renomado causídico da Corte, José Júlio de Freitas Coutinho. Seus flhos: Lafayette Coutinho Rodrigues Pereira, advogado; Olympio Coutinho Rodrigues Pereira, médico; Francisco Lafayette Rodrigues Pereira, médico e físico; Alberthina Bertha Lafayette Stockler Pinto de Meneses, escritora, casada com o deputado e médico Alexandre Stockler Pinto de Meneses; e Corina Lafayette de Andrada, casada com o embaixador José Bonifácio de Andrada e Silva.
Em 1902 morre sua esposa. Seguiram-se mais 15 anos de solidão em sua biblioteca, dedicando-se aos estudos, às leituras que lhe eram prazerosas e a saudade. Em sua chácara, Lafayette faleceu a 29/01/1917, após ficar 2 anos entrevado numa cadeira de rodas.
Por ocasião do centenário de sua morte, o governador de Minas, Benedicto Valladares Ribeiro, pelo decreto estadual nº 11.274, de 27 de março de 1934, mudou o nome da cidade de Queluz de Minas para Conselheiro Lafaiete, “em homenagem ao filho ilustre desta terra, considerado o maior jurisconsulto do Brasil em seu tempo”.
Em Queluz
Questiona-se o porquê de Queluz ter passado a se chamar “Conselheiro Lafaiete”. Vivia o Brasil, nos anos 30, o advento de um regime ditatorial. Para fortalecimento desse governo, carecia-se de figuras, para que, à semelhança da atuação delas em prol do desenvolvimento do país, se mirasse o ditador. Ingenuamente, dizem, Benedicto Valladares teria desejado homenagear o autor dos livros de Direito nos quais estudou.
Mas a insatisfação dos queluzenses de então, foi pelo fato de “Lafayette não ter feito nada pela sua terra natal” [sic].
No entanto, ao contrário, as correspondências trocadas com seu irmão, além de sua ingerência na política da Província, demonstram, sim, que ele acompanhava e opinava na política local. No entanto devem-se observar dois aspectos interessantes da época. A política administrativa de então era muito hierarquizada, o que só possibilitava a intervenção, mesmo das esferas superiores, se houvesse uma sintonia partidária. Ora, Queluz mantinha-se fel ao Partido Conservador, enquanto Lafayette militava no Partido Liberal. Então, a única forma de intrometer-se era por meio de seu pai, o Barão de Pouso Alegre, ou de seu irmão Washington, que foi delegado, promotor e juiz de Direito em Queluz.
Uma aversão, pois, à sua terra natal parece se desmistifcar a cada vez mais em que se aprofunda nos estudos sobre sua vida. Era aqui, no rincão de sua infância, a Fazenda dos Macacos, que se retirava todos os verões, enquanto seus pais viveram, fugindo da agitação da Corte. Também foi aqui que, ao retornar da França, após a proclamação da República, recolheu-se por alguns meses até que os ânimos exaltados pela tirania do marechal Floriano Peixoto se amainassem. Após essa sua última estadia, Lafayette não mais voltou a Queluz, por um simples motivo, como, aliás, confidenciara em carta ao seu irmão: sua mãe não mais vivia.
O bom Filho a casa torna
Em 2 de janeiro de 1966,foi colocado na praça Barão de Queluz o busto em homenagem ao patrono do município.
Em 5 de janeiro de 1985, as cinzas do Lafayette, vinda do Rio de Janeiro para nossa cidade, dentro das comemorações do ano de seu sesquicentenário, quando o ex-prefeito Vicente de Faria Paiva promoveu a transladação dos restos mortais do patrono do município, que foram encerrados num mausoléu que mandou erigir na Praça Barão de Queluz (já demolido).
No Museu Antônio Perdigão, está guardada a placa do túmulo do Conselheiro Lafayette, além de alguns objetos que pertenceram o patrono do município.
A pedido da família, foi retirado o mausoléu da praça e solicitado ao pároco Padre João Batista, que as cinzas do Conselheiro Lafayette, ficassem em definitivo na Matriz de Nossa Senhora da Conceição, ao lado dos seus pais.
O pedido foi aceito e em 17 de dezembro de 1990,a urna ficou em uma gaveta mortuária no interior da Matriz onde jazem os restos mortais de seus pais, Barão e Baronesa de Pouso Alegre, no interior da Matriz.
Em 2000, o prefeito Vicente Faria, criou o Memorial do Conselheiro Lafayette Rodrigues Pereira, no Centro Cultural “Maria Andrade Resende”.
Por Allex Milagre/2010
Eric Menezes/Atualização 2018
Saiba Mais
Lafayette Rodrigues Pereira – um ilustre queluzense
Autor: Allex Milagre
Biografia do jurista Lafayette Rodrigues Pereira, importante ministro de D. Pedro II nascido na fazenda dos Macacos, em Queluz de Minas. Hoje a cidade leva o seu nome. Este livro é a primeira biografia do patrono do município escrita por um lafaietense. Allex Assis Milagre (1971 – 2009) faleceu precocemente deixado um importante legado intelectual.
ALLEX ASSIS MILAGRE (1971 – 2009) foi um historiador, genealogista, jornalista, pesquisador e músico lafaietense. Fez parte de inúmeros institutos culturais e foi premiado em várias instâncias pela relevância do seu trabalho. Era uma pessoa muito religiosa e trabalhou intensamente na pesquisa e preservação de arquivos paroquiais da região. Entre suas atuações, criou o Memorial da Câmara Municipal de Conselheiro Lafaiete e presidiu a Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafayette (ACLCL) até o ano de sua morte.
Informações: Grupo Lesma
Lafayette – Um Jurista do Brasil
Autores: Pereira,Ligia Maria Leite / Medina,Paulo Roberto de Gouvêa / Faria,Maria Auxiliadora de
A presente obra é a primeira biografia, propriamente dita, do Conselheiro Lafayette Rodrigues Pereira. Dividida em duas partes, sendo a primeira, fruto de dedicadas pesquisas e lúcidas observações das renomadas biógrafas e respeitadas professoras da UFMG, Maria Auxiliadora de Faria e Lígia Maria Leite Pereira. Na segunda parte, o Professor Emérito de Direito da UFJF, Dr. Paulo Roberto de Gouvêa Medina, faz uma sólida análise crítica da obra jurídica de Lafayette.O livro traz fotos históricas, de família e de documentos de Lafayette e a reprodução integral do Vindiciae, texto de Lafayette publicado no Jornal do Commércio em que ele rebate Sylvio Romero na crítica que este escrevera sobre a obra de Machado de Assis.
Informações: Editora Del Rey
Outras obras
As suas obras denominadas Direito de Família e Direito das Coisas tornaram-se clássicos do estudo de Direito no Brasil, tendo sido utilizadas por várias gerações de estudantes. Abaixo estão os links para download:
- Direito de Família
- Direito das Coisas
- Princípios de Direito Internacional Público
- Vindiciae (Polêmica contra Sílvio Romero).
- Cartas ao meu irmão